Cerca de duzentos trabalhadores ocuparam a histórica fábrica Waterford Crystal em Kilbarry, perto de Waterford, na Irlanda. A ocupação começou na sexta-feira, em resposta à decisão da empresa falida de parar a produção por um período, fechar a fábrica (lock-out) e demitir cerca de 480 trabalhadores (de cerca de 800). As lojas da região têm fornecido alimentos e bebidas à ocupação.
O posicionamento da empresa, sob condições de um aprofundamento da crise econômica na Irlanda e internacionalmente, surgiu pouco depois de David Carson, um dos seus representantes, quebrar uma promessa feita anteriormente em nome da empresa, de que seria mantida a produção no local — onde são produzidos cristais de luxo para o mercado mundial.
Negociações pela compra da empresa estão em curso há algumas semanas, com dois potenciais compradores. A KPS Capital e a Clarion Capital consideram a compra do grupo Waterford Wedgewood, mas já relatam sua intenção de manter apenas 300 postos de trabalho na fábrica.
Membros do sindicato deixaram claro que não fariam nada para proteger os empregos dos trabalhadores. A Clarion apresentou uma nova proposta que aguarda a aprovação do sindicato Unite, com o secretário regional Jimmy Kelly afirmando que o Unite foi "encorajado" a aceitar.
Segundo a agência de notícias irlandesa RTE, somente 200 trabalhadores foram chamados para trabalhar no dia 02/02 — ou seja, aqueles que não receberam as cartas de demissão na sexta-feira à noite. O sindicato Unite, por sua vez, disse aos 200 restantes que aquele dia era um dia de trabalho normal.
A Waterford Wedgewood foi colocada sob administração judicial no mês passado, após não ter recebido uma extensão de crédito por parte dos bancos. A empresa emprega 800 trabalhadores em Waterford e mais de 6000 em todo o mundo, incluindo 1500 na Indonésia. Outras operações são terceirizadas em países como Brasil, Romênia e Eslovênia. A empresa ruiu após não conseguir pagar uma dívida de 449 milhões de Euros. Cerca de 367 demissões também foram anunciadas em Staffordshire, na Inglaterra, onde permanecem 1900 empregados pela empresa.
A ocupação é a prova de que amplas camadas dos trabalhadores buscam meios coletivos para resistir ao forte ataque contra seus padrões de vida que a crise financeira mundial traz consigo.
A intenção de Carson de parar a produção “vazou” aos trabalhadores e sindicalistas por antigos gestores da empresa. A notícia se espalhou a todos os trabalhadores e 60 ou 70 deles correram até a fábrica para paralisar toda a força de trabalho. Para outros, a primeira indicação do lock-out se deu quando o pessoal de segurança tentou fechar as portas. Nenhuma notificação oficial foi emitida aos funcionários, ou ao sindicato Unite.
Equipes de segurança privada que estiveram no local ao longo das últimas semanas tentaram barrar a ocupação, mas os trabalhadores conseguiram assumir o controle tanto da fábrica quanto de seu centro de visitação. Uma pessoa alegou ter se ferido levemente.
Cerca de 100 trabalhadores dormiram na fábrica durante a primeira noite. Colegas e parentes trouxeram roupas de cama e alimentos, enquanto um turno rotativo de oito horas foi estabelecido para garantir que até 40 trabalhadores estivessem no local a qualquer momento. Os trabalhadores dizem que estão comprometidos a permanecer no local até que a decisão do fechamento da fábrica seja revertida. Uma manifestação foi realizada fora da fábrica no sábado, da qual participaram cerca de 2000 apoiadores.
Muitos dos trabalhadores mais velhos trabalharam na Waterford por décadas, construiram pensões — que agora estão em perigo — e têm poucas perspectivas de um emprego alternativo.
John Dooley, um dos trabalhadores envolvidos, disse ao Irish Times que ainda espera receber 30.000 euros de pagamentos demissionais e mais 55.000 euros da empresa. "55.000 euros é pouco dinheiro para 46 anos de serviço — e seria necessário pouquíssimo dinheiro por parte do governo para manter este lugar funcionando. Nós vamos ficar aqui bastante tempo. Não temos nada a perder!".
Dooley entrou na empresa em 1962.
"Hoje eles puxaram nossa ficha", disse Jean Croke para o Irish Independent. "Fomos esquecidos. Muitos de nós viemos pra cá diretamente da escola, não trabalhamos em nenhum outro lugar. Como é que vamos arranjar um emprego agora? Não há nada lá fora para nós".
Por outro lado, as declarações dos membros do sindicato Unite deixaram claro que eles têm trabalhado estreitamente com a empresa desde o início de janeiro. Diante de toda a decadência da Waterford Wedgewood — um processo no qual milhares de postos de trabalho já foram perdidos — as relações entre a empresa e Unite têm sido amigáveis.
A principal preocupação do Unite é garantir que os cortes de emprego sejam por meios de pacotes, uma maneira de quebrar a resistência dos trabalhadores — pacotes de demissão por “invalidez” ou pacotes de demissão “voluntária”. Segundo afirmou o secretário do sindicato, Jimmy Kelly, no dia 5 de janeiro: "O sindicato vai colaborar estreitamente com todos os potenciais compradores da empresa, de modo a garantir o maior número de empregos".
Walter Cullen, outro membro do Unite, disse por telefone à imprensa que teve uma conversa com Carston — o representante da empresa — logo após o anúncio do lock-out.
Como disse: "Eu o lembrei que estava quebrando sua palavra, que tinha nos dado um compromisso de que não haveria demissões em larga escala semelhante à imposta em Wedgwood, e que, se uma decisão fosse tomada para fechar a empresa, ele teria de se reunir conosco para debater, pois temos alternativas. O que necessitamos agora é re-estabelecer o processo [de negociação], até que esta decisão seja revertida".
Além de colaborar com os potenciais compradores, os sindicatos irlandeses envolveram-se em conversas com o governo irlandês, para criação de uma nova "parceria" — garantir que os custos do colapso do capitalismo mundial, bem como o salvamento dos grandes bancos irlandeses, sejam repassados para a classe trabalhadora sob a forma de um grande congelamento dos salários.
Nada pode ser defendido por meio dos sindicatos burocratizados, vinculados em todos os aspectos ao capital irlandês e ao capital internacional. Os primeiros passos dados pelos trabalhadores da Waterford Wedgewood apontam para o caminho certo: desenvolver comitês independêntes de trabalhadores, com o objetivo, inclusive, de conseguir apoio de amplos setores da população, na Irlanda e em todo o mundo, que passa atualmente pelas mesmas pressões em seu nível de vida.
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